O Pe. Martin Sarmento (1758) se viu obrigado a responder a um caro amigo que lhe escreveu contando a sua insatisfação com seu estado de solteirice. Pe. Sarmento, então, não quis só socorrer ao amigo cheio de anseios e indecisões sobre o matrimônio, precisava também alerta-lo das dificuldades do casamento para o homem.
Apesar de parecer uma linguagem ofensiva para os padrões atuais, o texto escrito por ele não deixa de ter também um lado cômico. Para resumir seu conselho, Pe. Sarmento escreve este poema que tentarei traduzir fielmente para nosso idioma.
“Deixar-se levar por prontos discursos que adoçam o amargor de sua resolução, sacrificando o sossego de sua vida à totalidade de sua solidão, e as regras de sua descansada liberdade à suas paixões , empregas liberdade, saúde e vida a uma mulher que: se formosa, cuidado; se feia, martírio; se discreta, enfado; se néscia, tormento; se rica, domínio; se pobre, desconsolo; se altiva, brigas; se humilde, sentimento; se estéril, desgosto; se fecunda, trabalhos e, por último, vejas a grande descrição do casamento neste poema com que concluo, (…).
Guerrear, navegar e casar, não se pode aconselhar.
Entre muitos que ali se sentenciavam,
A penas, mortes e outros mil conflitos
Se encontrava um mau homem ao que acusavam
De crimes enormes e infinitos:
De mil roubos e mortes lhe carregavam;
Parricida*¹ cruel e outros delitos;
Em dúvida estavam sobre condenar-lhe,
Não alcançando qual morte crua dar-lhe.
Uns diziam, morra embarrilado*²:
Outros na forca, ou que se queimasse;
Outros esquartejado, outros atenazado *³,
Sem que nenhum dele se lastimasse;
Por último foi determinado,
Que um Juiz duro e cruel lhe sentenciasse;
E este disse com fúria, pois tomemos
A este mal homem e logo lhe casemos.
Não duvido que casar-se com uma mulher justa, pacífica, forte e prudente seja acerto. Mas, com tais moralidades e circunstâncias, o conselho deve ser muito escrupuloso. Encontrando-a com as bondades referidas, seja ela para vós coroa a quem representando-lhe aquela aguda e verdadeira sentença dos Sábios Atenienses, que em nada tem império a fortuna, como nos prestígios, guerras, navegação e casamento. Só posso oferecer-lhe meu dever e carinho, vivos desejos de que gozes com toda felicidade a uma larga vida. Mas, minha falta de visão não pode dar conselho sobre tão arriscada matéria, porque Guerrear, Navegar e Casar, não se pode aconselhar.
San Martin de Madrid a 10 de julho de 1758.”
*1 . Que ou quem matou seu pai ou sua mãe ou outro qualquer dos seus ascendentes; que ou quem cometeu parricídio.
*2 Ter morto envasilhado num barril
*3 Ter seus membros esticados até despedaçarem-se.