GUERREAR, NAVEGAR E CASAR, NÃO SE PODE ACONSELHAR – Conselho dado por um Padre a um jovem que se sentia incomodado com sua solidão.

james-tissot1836-1902

O Pe. Martin Sarmento (1758) se viu obrigado a responder a um caro amigo que lhe escreveu contando a sua insatisfação com seu estado de solteirice. Pe. Sarmento, então, não quis só socorrer ao amigo cheio de anseios e indecisões sobre o matrimônio, precisava também alerta-lo das dificuldades do casamento para o homem.

Apesar de parecer uma linguagem ofensiva para os padrões atuais, o texto escrito por ele não deixa de ter também um lado cômico. Para resumir seu conselho, Pe. Sarmento escreve este poema que tentarei traduzir fielmente para nosso idioma.

“Deixar-se levar por prontos discursos que adoçam o amargor de sua resolução, sacrificando o sossego de sua vida à totalidade de sua solidão, e as regras de sua descansada liberdade à suas paixões , empregas liberdade, saúde e vida a uma mulher que: se formosa, cuidado; se feia, martírio; se discreta, enfado; se néscia, tormento; se rica, domínio; se pobre, desconsolo; se altiva, brigas; se humilde, sentimento; se estéril, desgosto; se fecunda, trabalhos e, por último, vejas a grande descrição do casamento neste poema com que concluo, (…).

Guerrear, navegar e casar, não se pode aconselhar.

Entre muitos que ali se sentenciavam,

A penas, mortes e outros mil conflitos

Se encontrava um mau homem ao que acusavam

De crimes enormes e infinitos:

De mil roubos e mortes lhe carregavam;

Parricida*¹ cruel e outros delitos;

Em dúvida estavam sobre condenar-lhe,

Não alcançando qual morte crua dar-lhe.

Uns diziam, morra embarrilado*²:

Outros na forca, ou que se queimasse;

Outros esquartejado, outros atenazado *³,

Sem que nenhum dele se lastimasse;

Por último foi determinado,

Que um Juiz duro e cruel lhe sentenciasse;

E este disse com fúria, pois tomemos

A este mal homem e logo lhe casemos.

Não duvido que casar-se com uma mulher justa, pacífica, forte e prudente seja acerto. Mas, com tais moralidades e circunstâncias, o conselho deve ser muito escrupuloso. Encontrando-a com as bondades referidas, seja ela para vós coroa a quem representando-lhe aquela aguda e verdadeira sentença dos Sábios Atenienses, que em nada tem império a fortuna, como nos prestígios, guerras, navegação e casamento.  Só posso oferecer-lhe meu dever e carinho, vivos desejos de que gozes com toda felicidade a uma larga vida. Mas, minha falta de visão não pode dar conselho sobre tão arriscada matéria, porque Guerrear, Navegar e Casar, não se pode aconselhar.

San Martin de Madrid a 10 de julho de 1758.”

*1 . Que ou quem matou seu pai ou sua mãe ou outro qualquer dos seus ascendentes; que ou quem cometeu parricídio.

*2 Ter morto envasilhado num barril

*3 Ter seus membros esticados até despedaçarem-se.


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